Em que temos a chocante revelação de que Valdeci virou um emo
(No sofá estão sentadas três crianças: Tommy, de 10 anos; Penny, de 9 anos; Edilamar - um garoto - de 7 anos. Os três parecem estar em estado de animação suspensa, olhando como hipnotizados para uma garota de cabelos rosa-choque berrantes na TV à sua frente. Um homem e uma mulher de jaleco observam a cena em um monitor)
SCIENCE GUY - Precisamos aumentar em 7,5% o brilho e a saturação da tinta de cabelo de Marimoon. Objeto de Estudo Gama está piscando os olhos.
SCIENCE LADY - Hmmm?
SCIENCE GUY - Eu disse: precisamos aumentar em 7,5% o brilho--
SCIENCE LADY - Desculpa, mas por acaso meu gemido o fez pensar que a sua última frase terá algum mísero significado para a minha existência? Eu só estava sendo educada.
SCIENCE GUY - ...
(Science Lady dá um longo suspiro)
SCIENCE LADY - Desculpe, eu não quis ser mal educada. É que...
SCIENCE GUY - Tá, tá, tá bom. Isso é difícil pra mim também, sabia? Já é ruim o suficiente sem ter que aguentar sua TPM.
(Em silêncio os dois voltam ao trabalho. Alguns minutos depois, quando Timmy e Jenny chegam ao laboratório, a nuvem de mau humor se dissipa, apenas para ser substituída por um furacão de terror e ansiedade)
SCIENCE PEOPLE - C-Chefe!
TIMMY - Relatório. Agora.
(O homem se levanta com um sobressalto. A mulher parece se comprimir com cada vez mais força contra sua cadeira)
SCIENCE GUY - S-s-sim! O... quer dizer, a... a... a...
SCIENCE LADY - Precisamosaumentaremseteemeioporcentoobrilhoeass--
SCIENCE GUY - ...saturação da tinta de cabelo da Marimoon! Objeto de estudo Gama--
TIMMY - Onde está o gráfico de oscilação da voltagem dos eletrodos?
(A mulher entrega uma prancheta para Timmy, que agora também está vestido com um jaleco. Jenny se aproxima para olhar melhor o conteúdo dos papéis)
TIMMY - Mesma coisa. Quarta semana consecutiva sem nenhuma mudança.
(O casal se entreolha com apreensão)
SCIENCE LADY - Chefe, vai ser muito difícil recriar as condições do primeiro experimento. Talvez--
(Timmy retira casualmente uma caneta do bolso e comprime o botão em sua extremidade. Os dois pesquisadores imediatamente começam a tremer violentamente, despencando de seus assentos e assumindo posturas bizarras no chão do laboratório)
TIMMY - O que é que falta fazer? Já aumentamos em 47% a exposição a textos com erros ortográficos tirados da internet...
JENNY - A concentração de anúncios de serviços via mensagens SMS também nunca foi tão alta como agora.
TIMMY - Você ouviu a porta do elevador?
(A porta do laboratório se escancara subitamente. No corredor surge um adolescente por volta dos 13 anos de idade. Uma espessa camada de base em seu rosto tenta realizar a dupla tarefa de amenizar a acne a as assimetrias de sua face pós-púbere. Seus olhos são acentuados por grossas linhas de rímel; há um borrão em volta da pálpebra esquerda, que não pode ser percebido pois todo o olho esquerdo está encoberto por uma longa e lisa franja unilateral, com luzes de cor verde fosforescente. O restante do cabelo é curto e preto, com raízes castanhas. O rapaz está vestido com calças jeans e um top preto, deixando seu umbigo à mostra. A camisa parece ser estampada com uma ilustração de quatro zumbis deformados, identificados com as letras "NX ZERO". Suas unhas foram cuidadosamente pintadas para ficar com a coloração de esmalte preto roído. Ele entra e senta-se ruidosamente no sofá, com os braços cruzados, e dá um suspiro amplo e silencioso)
TIMMY E JENNY - ...
(O adolescente olha para os demais. Depois dá outro suspiro e parece prestes a chorar)
VALDECI - Nada nunca dá certo pra mim. Não espero que vocês entendam, claro.
TIMMY - Jenny, acho que para o próximo passo realmente vamos precisar de ondas subliminares de baixa freqüência.
VALDECI - Ninguém nem tenta me entender. Todo mundo preocupado com seus problemas idiotas e mundanos, nem ligam pra dor que eu estou sentindo.
JENNY - Eu continuo achando que nossa abordagem tem que ser mais direta; só porque o Professor era contra o uso de injeções não quer dizer que a gente precisa fazer o mesmo.
(Valdeci chora copiosamente)
TIMMY - Mas nada garante que isso vá acelerar o andamento da experiência; muito pelo contrário--
VALDECI - VOCÊS SÓ QUEREM ME USAR! Vocês fazem idéia do peso, do fardo que eu estou carregando? NÃO!!! Mas não tem problema, por que no final vocês vão se arrepender, vocês vão sentir a MESMA DOR que eu estou sentindo!!!
(Valdeci bate dramaticamente a porta ao sair do laboratório)
TIMMY - ...
JENNY - Sabe Timmy... será que vale a pena mesmo?
TIMMY - O que vale a pena?
JENNY - Isso. Isso tudo que estamos fazendo. Aquelas crianças...
TIMMY - Jenny, você leu o diário do professor. Você tem visto o que está acontecendo nas ruas. Alguém precisa se preparar para o que está por vir. Dadas as circunstâncias nós somos os únicos que ainda podem fazer algo. Certo?
(Jenny desvia o olhar por alguns momentos. O casal de cientistas ainda convulsiona no chão; parece que Timmy se esqueceu de desligar o botão da caneta)
JENNY - Eu só acho que... às vezes você precisa de um descanso. Só isso.
(Jenny dá as costas para Timmy. Ele pára um momento para pensar no que acabou de dizer. Não tinha sido completamente sincero com Jenny. A verdadeira razão pela qual reativou a Experiência; aquela tarde, entre as nuvens, em meio ao céu azul, quando tudo parecia perfeito. Ele iria recuperar aquela sensação, custe o que custasse)
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